domingo, 17 de dezembro de 2017

Aqui está a foto de uma foto, de quando ainda não exista whatsapp, ou pelo menos, eu ainda não tinha. 
Ontem, inspirada por Débora Noal, saí à procura de minhas memórias de Guiné Bissau, minha primeira missão além mar.
Revivi emoções e pude sentir meu coração quebrantado ao me lembrar de Nhá, a garota que carrego em meus braços. 
Pequena dama, desnutrida, cognitivo prejudicado, tinha 7 anos com aparência de 3. Nunca vi um sorriso em seus lábios, e os olhos de jabuticaba já não brilhavam mais, apenas fitavam o chão de poeira vermelha.
Napoleão, um jovem estudante de ciências médicas, dizia com frequência: "Nhá quer estar convosco".
Benisa, sua irmã mais velha, contou-me que seus pais morreram, e pediu gentilmente para que eu a trouxesse para o Brasil, pois ela precisava de tratamento. 
Senti-me refém das circunstâncias impostas pelo sistema e sua burocracia, queria trazê-la comigo. Na época eu ainda era uma garota, não tinha independência. Sabia que as consequências seriam imprevisíveis, mas eu não sentia medo, apenas o forte impulso em não vê-la mais distante de mim dali para frente. Meu instinto materno floresceu. 
Em um sábado quente, Benisa a levou na base onde eu estava hospedada, com a pequena ardendo em febre. Ela sabia que seu destino seria pó, caso permanecesse diante daquele quadro enegrecido e impotente.
No último dia de missão fui me despedir dela, chorei e sangrei por dentro. Gostaria de oferecer mais do que eu pude naquele momento.
Alguns meses depois minha partida, recebi a triste notícia de seu falecimento. Nhá descansou. Carrego-a comigo como se estivesse bem viva, ainda que dentro de mim.



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